domingo, 13 de julho de 2008

Achei lindo

Começar, de novo...
No fim de uma qualquer relação é imperativo parar para pensar, para fazer o balanço, para reflectir.
Acima de tudo, para reestruturar.
Ter tempo e vontade para querer, poder e saber arrumar as recordações, porque as há, sempre.
É a oportunidade, o momento para encaixotar os cenários, os cheiros, os toques, as sensações, as imposições, as devoções, os carinhos, os significados e os significantes, as etiquetas que remetem para os mais diversos capítulos e cenas que constituíram a relação, que terminou.
E essa é uma verdade que é imperativo não esquecer, até porque serve de impulso, de ferramenta, de estratégia, para conseguir concretizar o que se pretende...encerrar, definitivamente, uma relação que terminou.
Após cada relação que termina, nada fica como dantes.
O tempo passou.
O tempo mudou.
São as recordações que, habitualmente, custam a deixar para trás.
Estão presas à pele, estão dentro da pele, fazem, já, parte da própria pele...
Até o próprio passado teima em pregar partidas, permanentemente, em despoletar recordações, de forma imprevista e imprevisível, em qualquer momento, mesmo nos mais improváveis e estranhos, nos mais pequenos pormenores do dia a dia.
São recordações, que saltam, que brotam, indomáveis.
São momentos de Afectos que voltam ao de cima, da penumbra dos tempos...
E doem...
E magoam...
Tenho que concordar que recordar é viver, mas não é sadio, não basta.
E as recordações explodem, e implodem, muitas vezes em catadupa.
Dos momentos, uns deliciosos, outros nem por isso. Uns mais conturbados, outros saborosos, um filme a recordar, um baú de sensações, emoções, devoções e por vezes, mesmo, imposições.
Mas urge fechar.
Urge fechar tudo!
Empacotar!
Encerrar!
Deixar ficar no escuro, na penumbra, como se de uma sala de recordações, de momentos, de uma outra qualquer época e realidade se tratasse. Porque é mais um acervo, a constituir e a construir o património próprio de Afectos, inquestionável e inviolável.
Inegável!
Indestrutível!
Imutável mas, acima de tudo, assimilável e ultrapassável...
Depois é preciso, é justo, é imperativo... renascer!
Fazer a reconstrução definitiva, para ser possível avançar.
Fazer a paz com o passado.
Reaprender a olhar, a ver, a sorrir, a caminhar, a saborear, a evoluir...em frente.
De início a sós...preferencialmente.
Protectoramente.
Saudavelmente.
Ergonomicamente.
Pedagogicamente.
Cortar, tranquilamente, o cordão umbilical com o passado.
Um crescer em plenitude, jamais negando o que ficou para trás, jamais esquecendo a aprendizagem, a aquisição, até porque “Nada seria sem o meu passado, mas nada seria, também, se me tivesse contentado com ele”.
É fazer o luto.
É o lamber das feridas, porque as há sempre e induzir, de forma assertiva, a sua cicatrização.
E depois...
Depois urge renascer.
Abrir e criar janelas de oportunidade.
Dar direito, oportunidade e espaço à luz.
Começar de novo.
E esse é, sem dúvidas, o grande desafio.
Começar, de novo.
Conseguir tirar do passado novas competências, novas estratégias para avançar, evitando cometer os mesmos erros, porque errados e antigos.
Começar, de novo.
Voltar a querer.
Voltar a crer.
Voltar a querer investir.
Voltar a querer acreditar.
Voltar a ter vontade de amar...o que é um desafio, pesado, sofrido, ínvio, perigoso...quase desacreditado.
Mas que se impõe!
Por dignidade, por justiça, por merecimento, por sentido de sobrevivência.
Estar disponível.
Estar disposto.
Estar pronto...
Para voltar a acreditar.
Para voltar a investir.
Para voltar a sonhar.
Para voltar a crescer...em relação.
Também aqui o passado é traiçoeiro porque, de forma sibilina, induz a comparações, branqueando os defeitos e hipervalorizando as qualidades de um passado que se quer tranquilamente distante. E esta é uma perigosa tentação porque impeditiva de um avanço, de um progresso, de um corte, quiçá epistemológico.
Mas urge continuar.
Urge avançar.
Urge voltar a ter vontade de viver.
De crescer.
De amar.
De ser feliz...assumidamente, de forma assertiva e em tranquilidade.
Decididamente.
Em paz consigo próprio e com o passado.
Enfim...começar de novo!

Manuel Damas in "O Primeiro de Janeiro

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